A vida num instante

Quanto da gente está contido, reprimido, guardado num piscar de olhos que a gente expressa numa gentileza? Naquele momento no qual a gente quer dizer um "ok" mais rápido, como se o "ok" já não fosse por si mesmo uma pressa? Não sei não, mas faz uns dias que ando acordando desconfiada de que a vida toda, com seus cem anos de sorte e velhice para que tem sorte e velhice, está toda reunida num instante. Naquele ensejo que ele deixou para que eu insistisse para ele não me deixar. Naquela oportunidade de prolongar o silêncio quando eu, burra, burra, burra, tagarelei rotinas na tentativa de burra, burra, burra, esconder o meu desejo de me calar e de ficar olhando, assim, pra ele em silêncio. Ou naquele instante que eu fiz quietude, quando o que eu devia mesmo era ter vivido de palavras e ter falado logo para ele que o que queria mesmo era que ele não falasse nada e chegasse mais perto, assim, de mim. A vida nos segundos que me equilibro entre arrumar o cabelo e ir ensaiando até a porta como falar "Oi, tudo bem?" sem dar muito na cara que estou muito melhor agora que ele tocou a campainha. A vida inteira num pedaço de bolo de aniversário, que a gente não vê a hora da mãe da aniversariante entregar na nossa mão. Aquele momento que prenuncia a descida na montanha russa, que foi na verdade o motivo da gente ter passado quase uma vida na fila do parque de diversões. O espaço de tempo que vai da onde quer que eu esteja para onde o telefone está quando é ele quem está ligando. Aquele sorriso de surpresa que a gente abre quando uma criança chama a gente devagar puxando a barra do nosso vestido. Instantes em que a vida é instante e nos quais a gente é exatamente aquilo que sempre seremos mesmo daqui cem anos, sabe?

Comentários

ana disse…
Adorei!!lindo isso, saudades beijos ana

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