Do mundo das coisas inacabadas

Em frente aos fogões a lenha, as antigas amanheciam antes do Sol e talvez se deitassem antes de estarem cansadas para o outro dia. O que havia naqueles temperos do passado e nas manhãs em que o galo era acordado por elas só podia ser um mistério das coisas inacabadas. Nos mercados em que iam determinadas ao gosto das massas não se encontrava nada pronto. Eram as farinhas, eram os ovos e mais o que precisavam cheirados com os dedos, olhares e narinas como se as antigas estivessem a escolher uma concha integra de caramujos vivos numa praia de conchas pisadas. Voltavam ao lar e amanheciam no dia seguinte. Estavam dispostas a passarem o pré-almoço preparando a refeição da família com um amor que não tem pressa para gulodices. O vinho que se punha à mesa havia sido preparado há muitos anos e naqueles dias tinham elas o privilégio de colher os verdadeiros frutos da uva. Estavam no tempo certo no qual as coisas nunca estavam prontas e necessitavam delas para o preparo e, consequentemente, para o seu sabor.
Nos dias de hoje, as antigas diriam que o mau do mundo são as coisas prontas. São esses pacotes que se vendem no mercado e que podem se comprar muito depois de se apagar a luz do Sol. Aquelas mulheres diriam que, na verdade, não estamos prontos para o passado e ansiamos com muita pressa e desgraça o sabor do futuro. E desse mundo que nos dá temperos prontos e não nos dá paladar, diriam espantadas:

- Oh, mundo de coisas prontas a se acabarem!

Comentários

Luciana disse…
Aquilo que se tinha antigamente, infelizmente, é algo muito raro nos dias de hoje...

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